Artigo de Raquel de Sá
O IPCA, nosso principal indicador de inflação ao consumidor, registrou queda de 0,08% em junho, levando o acumulado em doze meses a desacelerar para 3,16%. A queda deve ser pontual, e os preços seguem pressionados no setor de serviços – ainda indicando cautela adiante.
A inflação medida pelo IPCA, nosso principal indicador de preços ao consumidor, registrou queda de 0,08% em junho de 2023. O resultado mensal levou o índice para 3,16% no acumulado em doze meses, desacelerando em relação ao observado em maio – quando estava em 3,94%.
Normalização global, alimentos, moeda e juros altos enfraquecem inflação
A inflação em queda por aqui reflete movimentos globais, especialmente a normalização e reequilíbrio de choques recentes (pandemia, guerra) e o processo em curso de alta de juros em países desenvolvidos – que desaquece a economia global, reduzindo a pressão sobre preços como os de commodities. O petróleo, por exemplo, caiu de 125 dólares o barril em junho do ano passado para 78 dólares hoje (10 de julho de 2023).
A queda dos preços de alimentos no mundo também tem contribuído para esse movimento, na esteira de questões climáticas e forte produção – como observado no Brasil.
A valorização recente do real – também tem ajudado no controle da inflação. Afinal, grande parte do que consumimos é importado ou possui partes importadas (como nosso pãozinho diário, que usa farinha importada), fazendo com que o valor da nossa taxa de câmbio seja um componente bastante importante para a inflação.
Finalmente, o enfraquecimento da inflação no Brasil também é reflexo da taxa de juros em patamar contracionista – ou seja, que tem como objetivo desaquecer a economia e reduzir a pressão sobre os preços. Como detalhamos aqui, a nossa básica de juros está em 13,75% desde outubro de 2022.
Vale destacar, entretanto, que parte importante da queda da inflação acumulada em doze meses vista nos últimos meses reflete o que chamamos de “efeito base”. Isso porque a redução de impostos implementada ano passado (afetando o preço de combustíveis, energia e telecomunicações) exerce uma espécie de “pressão oposta” na conta acumulada ao longo do último ano – impactando os resultados entre abril e junho desse ano, ao registrar parte dessa queda artificial.
Deflação é pontual, e serviços ainda preocupam
O resultado de junho veio um pouco acima do esperado pela maior parte dos analistas de mercado, que projetavam queda de 0,1%.
Conforme esperado, a deflação de junho em relação a maio foi puxada por:
1. automóveis novos, que caíram 2,8% no mês como reflexo do programa de incentivos do governo federal, mas ficando abaixo do esperado por analistas;
2. gasolina e gás de cozinha – na esteira da redução de combustíveis anunciada pela Petrobras em meados de junho; e
3. alimentos, com destaque para carnes (que caíram 2,1%), leite e derivados (-1,28%), frutas (-3,38%) e óleos e gorduras (-5,32%).
Mas a deflação no mês não significa que outros preços não seguiram em alta. Preço de aluguéis e taxas (com alta de 1,24%), passagem aérea (que subiu 10,96%), e energia elétrica (com elevação de 1,17%) ilustram esse movimento.
Além disso, o enfraquecimento da inflação em bens industriais e alimentos não tem seguido o mesmo ritmo no setor de serviços. Alimentados por uma demanda ainda aquecida, os preços no setor – que inclui de serviços de streaming, a manicures, restaurantes e cinemas – seguem acelerando ao ritmo de aproximadamente 7,0% ao ano. Ou seja, muito acima da meta do Banco Central de 3,25% para o ano, e do patamar que vemos nos bens de um modo geral.
Para ilustrar, em junho, a medida chamada de “serviços subjacentes” – que exclui preços mais voláteis como hotéis, passagens aéreas e tarifas de internet – subiu 0,62%, bem acima das projeções.
O que esperar?
Para o dia a dia dos brasileiros, o processo de desinflação observado nos últimos meses ajudou a reduzir a sensação de perda do poder de compra. Os resultados vistos nos últimos meses reforçam esse cenário, em que o “primeiro estágio” da desinflação no Brasil, puxado por alimentos e bens industriais, tem sido bem-sucedido e parece caminhar para o fim.
Porém, a persistência da alta de preços ainda forte em alguns itens, especialmente no setor de serviços atenua essa percepção. Ou seja, o “segundo estágio” de desinflação está longe de ser concluído.
Esse cenário reflete que a inflação perdeu força, mas ainda não saiu do radar dos brasileiros – e nem do Banco Central, que optou por manter a taxa básica de juros, a Selic, em 13,75% em sua última reunião, em junho. Assim, vemos o Banco Central começando a reduzir a taxa Selic em agosto, mas a passos graduais, encerrando o ano de 2023 em 12,00%.
Após atingir o que entendemos ser o menor valor do ano (no acumulado em doze meses) em junho, projetamos que o IPCA reacelere gradualmente até dezembro, encerrando 2023 em 4,7%.
Adiante, vemos a inflação seguindo em patamar relativamente mais baixo do que o visto esse ano, mas ainda acima da meta do Banco Central (de 3,00% em 2024) – encerrando 2024 em 4,1%.
Enviado por Luiz Fernandes Lopes, Economista
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J. Silva, ITZ/MA